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Quem foi Tchaikovsky?

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Livro “Tchaikovsky: the man revealed”

Livro “Tchaikovsky: the man revealed”, de John Suchet

Eu não estava preparada para o conteúdo desse livro. Do pouco que eu sabia sobre a vida do compositor mais aclamado na história dos ballets de repertório, nada se compara com o que descobri na leitura dessa biografia.

Tchaikovsky: the man revealed foi realmente uma grande revelação sobre cada aspecto da vida de Tchaikosvky: a infância numa casa idílica no interior da Rússia, a perda prematura da mãe, a culpa pela homossexualidade, a depressão, as dificuldades como compositor, o casamento conturbado… . Cada página reconstrói um pouco de Tchaikovsky, num relato preciso e fascinante.

Pegue seu café, que hoje tem história.

A vida de Tchaikovsky

Infância

Pyotr Ilyich Tchaikovsky nasceu em 7 de maio de 1840 na pequena cidade de Votkinsk, na Rússia. Segundo mais velho dentre 6 irmãos, desde pequeno gostava de aprender; com apenas 6 anos de idade, já lia francês e alemão fluentemente.

Além da notável inteligência, outra característica marcou Tchaikovsky desde a infância: sua extrema sensibilidade. À menor crítica ou reprovação, Tchaikovsky se feria profundamente. Um exemplo disso foi a vez em que, depois de ouvir pequenas críticas, o pequeno Pyotr se trancou no quarto e se recusou a sair durante 7 horas.

O contato com a música teve início quando o pai de Tchaikovsky trouxe de viagem o orchestrion, uma máquina capaz de simular os sons de uma orquestra. Foi a partir de então que Tchaikovsky conheceu músicas de Bellini e Donizetti e passou a venerar as obras de Mozart. Para a surpresa de seus pais, pouco tempo depois Tchaikovsky conseguiu recriar no piano as músicas que ouvia no orchestrion.

Orchestrion, máquina que simula os sons de uma orquestra.

Atentos ao talento do filho, logo os pais de Tchaikovsky designaram uma professora para lhe dar aulas de piano – a quem ele foi eternamente grato.

Adolescência

Tchaikovsky era extremamente ligado à mãe, Alexandra. Quando tinha apenas 10 anos, Tchaikovsky foi enviado a estudar num internato em São Petersburgo, enquanto a família permaneceu morando a 800 km de distância. Apesar disso, sua mãe o visitava com frequência, sabendo da fragilidade de Pyotr pela separação.

Certo dia, no entanto, Alexandra não pode mais adiar sua partida permanente, em especial ao considerar que seus filhos gêmeos Modest e Anatoly tinham apenas poucos meses de vida. Esse dia criou um trauma enorme em Pyotr, que agarrou o pescoço da mãe para impedi-la de ir embora. Separado à força, Tchaikosvky correu em desespero atrás da carruagem, até ela se afastar em velocidade.

A verdadeira despedida, porém, ocorreu quando Tchaikovsky tinha acabado de completar 14 anos: sua mãe Alexandra morreu repentinamente de cólera, uma doença comum à época. Essa notícia devastadora marcou Tchaikovsky para sempre, que relembrou o evento em seu diário por toda a vida.

Tchaikovsky sentiu-se culpado pela morte da mãe. Naquele período, ele estudava na Escola Imperial de Jurisprudência, onde conheceu diversos rapazes e se relacionou com alguns deles. Se ser gay hoje ainda é difícil, na Rússia do século XIX era um fato inaceitável perante a sociedade, além de ilegal. Assim, é fácil imaginar o quanto a sexualidade de Tchaikovsky o constrangia. A morte da mãe, certa vez ele escreveu, foi um castigo por sua condição:

Toda minha vida tem sido uma corrente de infortúnios por causa de minha sexualidade – Pyotr Ilyich Tchaikovsky.

O homem x o músico

Tchaikovsky se formou aos 19 anos na Escola Imperial de Jurisprudência, de onde partiu para trabalhar como servidor no Departamento de Justiça. O trabalho, rotineiro e nada desafiador, permitiu que Tchaikovsky desenvolvesse o desejo pela música. Ao se inscrever no recém-aberto Conservatório de São Petersburgo, Tchaikovsky decidiu abandonar a carreira no serviço público para seguir sua verdadeira paixão.

No Conservatório, Tchaikovsky foi um aluno extremamente dedicado e exemplar. Isso não quer dizer, porém, que sua carreira na música foi fácil: Anton Rubinstein, músico aclamado na época, foi seu professor e, sem piedade, despejou severas críticas sobre o primeiro trabalho de Tchaikovsky, A Tempestade. Aliás, como é revelado adiante na biografia, Rubinstein nunca lhe poupou críticas, que sempre atingiram Tchaikovsky profundamente, contribuindo para sua insegurança.

Uma vez formado no Conservatório, Tchaikovsky foi a Moscou como professor de teoria musical na Sociedade de Música Russa e empregado no Conservatório de Moscou. O que se segue na carreira de Tchaikovsky a partir daqui são diversos trabalhos duramente criticados por seus pares. Até ele finalmente receber o merecido reconhecimento, muitos anos vão se passar.

Quando O Lago dos Cisnes veio a público, por exemplo, houve quem dissesse que era uma obra “pobre de fantasia criativa e, em consequência, era uma monotonia temática e melódica“. Tchaikovsky concordou com as críticas, afirmando que era um “trabalho medíocre“. Como bem se sabe, hoje O Lago dos Cisnes é considerada uma de suas mais belas obras.

Paralelamente, a vida pessoal de Tchaikovsky fica turbulenta. Embora nunca tivesse negado para si sua preferência sexual, num impulso Tchaikovsky pediu em casamento a mão de Désirée Artôt, uma soprano de voz belíssima que cativou sua atenção. A relação, porém, terminou antes de começar, já que a cantora acabou se casando com um barítono espanhol mesmo depois de ter aceitado se casar com Tchaikovsky.

Tchaikovsky e Antonina Milykova.

A segunda mulher que Tchaikovsky pediu em casamento surgiu numa conveniência de circunstâncias. Consciente de que sua homossexualidade despertava rumores e poderia arruinar sua carreira, Tchaikovsky decidiu que precisava se casar. Nesse período, numa conveniência infeliz, Antonina Milykova lhe enviou uma carta declarando seu amor. Tchaikovsky se casou com Antonina, mas o casamento fracassou. Antes mesmo de se casar, Tchaikovsky já estava arrependido, mas seguiu adiante – e se arrependeu ainda mais. Durante o resto de sua vida ele tentou ao máximo se afastar da esposa e se divorciar. O divórcio nunca aconteceu.

Von Meck

Uma personagem importante na vida de Tchaikovsky e que não pode deixar de ser citada é Nadezhda von Meck. Uma mulher decidida, altiva, viúva e muito rica, von Meck era também uma grande admiradora da música e, como tal, era uma das benfeitoras da Sociedade de Música Russa.

Em 1876, von Meck queria empregar um violinista para acompanhá-la no piano e viajar com ela e a família. Para, isso, ela contatou Nikolay Rubinstein, diretor do Conservatório de Moscou, que indicou Iosif Kotek, um músico recém-formado no Conservatório, para o trabalho. Através dele, von Meck descobriu que Kotek teve Tchaikovsky como professor; interessada nas músicas que ela e Kotek poderiam tocar, von Meck então ofereceu a Tchaikovsky uma quantia substancial em troca de algumas obras para piano e violino.

Nadhezda von Meck.

Como Tchaikovsky precisava de dinheiro na época, ele rapidamente produziu algumas peças e as enviou. Nadezdha ficou encantada com o resultado e enviou uma delicada carta dizendo que a música de Tchaikovsky tornava sua vida mais leve. Este, por sua vez, respondeu agradecendo pelas belas palavras.

Esse foi o início de uma grande sucessão de cartas entre von Meck e Tchaikovsky. Mais de mil cartas foram trocadas desde então, e uma curiosa amizade por correspondência se estendeu por vários anos. Nadezdha von Meck também se tornou benfeitora de Tchaikovsky, o que deu liberdade ao músico para compor suas mais belas criações.

Ficha técnica

Título: Tchaikovsky: the man revealed

Editora: Pegasus Books

Ano: 2019

Autor: John Suchet

Número de páginas: 288

ISBN: 978-1643131337

Disponível em e-book

Sobre a leitura

Livro físico

A estrutura do livro é elegante, como não poderia deixar de ser. Capa dura, páginas de impressão fotográfica, imagens bem definidas, boa diagramação e fonte confortável para leitura. Só pelo material do livro já se sabe que é uma leitura que deve ser apreciada por longas horas.

Prólogo

O prólogo do livro relata como foi a morte de Tchaikovsky. Ou melhor, como se acredita que ela aconteceu.

É interessante que o biógrafo tenha escolhido começar pelo fim da vida do compositor. De certa forma, é uma maneira de preparar o leitor para a imensa tristeza que o término do livro pode causar adiante. Quando terminei de ler, não senti apenas uma ressaca literária. Foi realmente uma tristeza de luto, como se depois de ler o livro eu tivesse perdido um ente querido. O fato de eu ter lido o último capítulo ao som de Pathétique (última composição de Tchaikovsky) contribuiu para o lamento.

A escolha de começar pela morte de Tchaikovsky também é uma estratégia para se voltar ao início do livro. Isso porque, ao final, o autor revela que até hoje não se sabe ao certo a causa da morte de Tchaikovsky. Muitos afirmam ter sido cólera, porém alguns fatos, como o de Tchaikovsky ter sido velado em caixão aberto, questionam se ele realmente tenha tido a doença. Essa e outras dúvidas obrigam o leitor a reler o prólogo e entender que existe uma versão oficial que nunca foi totalmente comprovada.

Organização e pesquisa

O autor se preocupou em sanar o máximo possível de dúvidas que o leitor possa ter a respeito de Tchaikovsky.

Primeiro, a ampla bibliografia que ele utilizou de pesquisa. A diversidade de fontes certamente foi imprescindível para o resultado final. O detalhe interessante é que o autor não usou nenhuma de suas fontes sem uma análise crítica: os diversos trechos das cartas que são transcritos ao longo livro, por exemplo, sempre vêm acompanhados de observações objetivas e sagazes. Essas observações talvez sejam o que tornam o livro mais enriquecedor, já que acrescentam uma visão inteligente das situações narradas sobre a vida de Tchaikovsky.

Segundo, os elementos extras auxiliam muito o leitor a entender a história. O livro conta com uma árvore genealógica da família Tchaikovsky, índice alfabético, índice bibliográfico, linha do tempo, notas de rodapé, fotografias legendadas. Com todos esses elementos, é impossível fazer uma leitura apressada.

Terceiro, a linguagem clara e cativante de John Suchet desperta curiosidade para prosseguir na leitura. O livro, portanto, não é simplesmente uma biografia que lista diversos fatos; é uma prazerosa experiência de leitura, na qual se conta a vida de um grande personagem da história da música.

Conteúdo

Esse livro é repleto de melancolia, tal como era a natureza de Tchaikovsky. Sofri muito com ele através das páginas, sempre me perguntando quando ele finalmente seria feliz. São tão raros os momentos que narram situações alegres que até me surpreendia quando eles apareciam.

A verdade é que Tchaikovsky sofreu muitos traumas já na infância, que contribuíram para seu estado clínico de depressão. Durante a leitura, fica claro que esse seria um diagnóstico muito provável do músico, se ele vivesse hoje.

Apesar desse estado natural de insegurança e tristeza, Tchaikovsky era um homem resiliente. Nenhuma das inúmeras críticas que ouviu o impediram de seguir compondo. Sim, ele se abalava muito, mas no dia seguinte sentava mais uma vez e partia para um novo projeto. Apesar de tudo, a paixão pela música fazia Tchaikovsky persistir.

Pyotr Ilyich Tchaikovsky, em pintura de Nikolay Kuznetsov.

O que mais me entristece sobre a biografia Tchaikovsky não é sua natureza, mas o tanto de reconhecimento que ele deixou de ter. É verdade que ao fim de sua vida ele foi muito aclamado. Porém, na leitura do livro, me pareceu que não foi o suficiente. O sucesso de obras como O Lago dos Cisnes e O Quebra-Nozes, por exemplo, Tchaikovsky nunca teve a oportunidade de presenciar.

Conclusão

Por fim, tudo o que posso dizer é que é um livro marcante. Levarei sempre comigo a história de Tchaikovsky, a quem passei a admirar ainda mais.

Esse livro deveria ser parte da biblioteca de qualquer músico ou bailarino.

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